Conhecimento é poder.

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Por que o ler faz bem ao que há dentro de nós.

quarta-feira, 4 de maio de 2016

Problematizando o amor



Há um tempo atrás fui tomado pela seguinte pergunta: Moisés, para você o que é o amor?

Claro que já pensei mais de uma vez no que poderia significar isso para mim já que eu sempre sou uma pessoa primariamente tão complexa (na visão dos meus próximos) com relação aos sentimentos e a forma de atuar com o outro, que tomado pelo meu narcisismo (não vejo crime em ser narcisista ou egoísta!), acho que pessoas próximas a mim gostariam de saber como eu vejo aquele que é considerado o mais puro dos sentimentos - e por muitas vezes também o mais cruel!

Mas, para falar sobre o amor, gostaria de pensar em algo que fosse além daquilo que meus amigos viveram em suas experiências errantes, com ou sem sucesso. E, para não dizer que não falei das flores, as minhas experiências também.

Quis ler o amor, e sobre o amor, perdoem-me os franceses e os italianos, ninguém o definiu melhor que os gregos. Os gregos tinham seis formas de amar, isso é o mesmo que dizer que os gregos amavam de seis maneiras diferentes.

O primeiro amor dos gregos era conhecido como Eros, visto pelos gregos como uma forma perigosa de amar, por ser ardente e irracional poderia dominar e possuir uma pessoa. Não se tratando somente do amor da paixão sexual e o desejo. No entanto, apesar de passar pela reprovação de muitos, acho-o contraditório num tempo em que o que todos querem hoje em dia é apaixonar-se loucamente.

A amizade, muito mais valorizada do que o sexo pelos gregos, o amor chamado Philia, representava o sentimento profundo que se desenvolvia entre amigos, a ponto de fazê-los tornar-se irmãos. Tamanha atemporalidade deste sentimento que fez com que no livro de Provérbios 17:17, surgisse um pequeno versículo de significado gigantesco: Em todo o tempo ama o amigo e na angústia surge o irmão. O amor conhecido por Philia teve ainda uma vertente de si, Storgé (estorgué), que tentava incorporar o amor entre pais e filhos.

Crianças e jovens amantes também tinham sua forma de amar e este amor dava-se na diversão sutil, no flerte, nos olhares tímidos, hoje, para nós, nada mais é do que um dançar numa festa com um estranho, sentar-se em um bar com amigos, contando piadas, rindo... a esse amor, damos o nome Ludus, que resultou na palavra lúdico.

O amor incondicional, Agape, esses todos conhecemos, aquele que envolve negar a si mesmo em função do outro. Aquele da música da Ana Carolina com a Maria Gadu, Mais que a mim, e de muitas outras músicas, talvez seja um dos amores mais cantados. É o amor sofrido, o amor de quem está disposto a se dar pelo outro esperando o que o outro se dê de maneira igual sem entender que cada um tem seu próprio modo de demonstrar o amor e, se uma pessoa não lhe demonstra isso como você gostaria que ela fizesse, não significa que ela não o ame com tudo o que tem, é apenas sua maneira de demonstrar. No entanto, está quase que aqui o X da questão, sonhar, esperar, sofrer, culpar (se deu errado, foi sempre o outro quem errou, somos cheios de máculas, certezas, etc)...

Há ainda o amor maduro, o profundo entendimento de quem está com alguém há muito tempo e não sofre, não chora, entende o outro, são praticados entre o casal a paciência e a tolerância. De acordo com o psicanalista Erich Fromm, gasta-se muito tempo “caindo na paixão” e o correto seria aprender mais sobre como “ficar de pé no amor”. Este amor chamado Pragma tem uma profunda relação com saber ficar de pé no amor, saber fazer um esforço para dar amor ao invés de simplesmente recebe-lo, exigi-lo do outro.

Por último, o auto amor ou Philautia, que em uma definição de Aristóteles “Todos os sentimentos amigáveis por outros são uma extensão dos sentimentos do homem por si mesmo”.
Isso fatalmente não responde à pergunta:  O que é o amor para mim?

Para mim, o amor é amor. E isso é algo tão sólido quanto uma areia movediça!

O que vejo ao longo das minhas experiências pessoais é o amor sendo tratado como uma busca simplesmente desesperadora pelo ágape, todos querem alguém que lhe dê amor e poucas vezes se está disposto a retribuir de maneira igual. Toma-se um copo de cólera na expectativa de que o outro faça por nós o que dizemos estar dispostos a fazer pelo outro.
Cria-se uma guerra interna na qual o amor faz do outro uma propriedade. Não se sente amor, se tem o amor.
Nos nossos dias atuais, o amor é apenas algo que se tem para dar a alguém. Quantas vezes alguém diz sentir isso? Apenas se ouve dizer sobre ter. O amor em si, como sentimento abstrato que é tornou-se uma propriedade tangível, comprável, digna de ser posse de alguém em função do outro.
Por amor, há pessoas capazes de um tudo: chorar, sofrer, aprisionar, matar, pouco se é capaz de amar. A questão está em, somos mesmo capazes de amar? Somos maduros o bastante para entender o ser humano como algo livre? Nosso amor pelo outro deixa-o livre para ir aonde quiser e bem entender sem que soframos pela partida e apenas respeitemos o direito do outro de fazer de si o que melhor entender? Estamos mesmo aptos a entender o outro como queremos ser entendidos? Temos todos a capacidade de mudar o argumento ao invés de mudar o tom de voz como exigimos que o outro faça?
O que me vem à mente é uma frase de um autor do qual hoje não gosto tanto, mas já li muito (e ainda ouso algumas recomendações bibliográficas), Paulo Coelho, que em seu livro ‘As Valkírias’ traz a frase: “A gente sempre destrói aquilo que ama”. Por anos me coloquei a pensar na verdade embutida nessa frase. Quantas pessoas já não mataram por amor? E não falo somente do amor entre duas pessoas. Historicamente, o próprio deus dos cristãos que “É amor” e “também fogo consumidor”, foi a causa de muitas e muitas mortes nas mãos daqueles que apenas seguiram o mandamento de “Amar ao seu próximo como a ti mesmo”, que foram ao mundo e pregaram a Palavra. O amor que mata o outro e tira de nós o pouco que temos de dignos, de felizes, de fieis.
Pareço um Nietzsche matando o amor! Não é isso!
O amor tem muito de bom em si. Não há nada mais belo, mais amoroso do que uma mãe que após um longo tempo de dor para dar à luz sua criança, esquece-se da dor em suas lágrimas ao ter o filho em seus braços. Toda aquela dor não existe! E isso é amor!
O amor é muito!
O amor que está presente quando uma pessoa ajuda a outra: a um cego a cruzar um sinal, dar o lugar a um idoso no ônibus, alimentar uma pessoa ou um animal que tem fome, dar uma simples informação sobre um lugar, etc. Tudo isso é amor também.
Mas se eu tivesse de definir o amor em uma só palavra, diria que o amor é liberdade.
Ver algo livre, deixar livre é a maior prova de amor que há. Tudo aquilo que é livre volta a nós por espontânea vontade, por reconhecer ser nosso sem que precisemos avisá-lo. O que é nosso ouve no bater de uma onda que abraça a areia em sua saudade e grita o seu nome em silêncio, e volta. Ouve nosso nome no silêncio de um vento frio que lhe toca o rosto, e volta. O que é nosso, sempre volta, e o amor está envolvido nisso. É disso que se trata o amor.
Gostamos de sentir que somos amados, pois não sabemos viver sem simbolismos ou representatividades que nos leve ao outro ou o traga a nós.
Ainda acho cruel que consideremos o amor como uma oposição do ódio, pois acho que cada pessoa que consegue dizer sentir ódio foi aquela que muito amou. O ódio é um sentimento que tem o amor como base.
Se eu tivesse de pensar numa oposição para o amor, essa oposição seria a perda, pois no amor, somos dispostos a tudo, menos a perder.
E um dia alguém parou e me perguntou: “Moisés, para você, o que é o amor? ”
Pensei: Já amei mais que a mim. Já sofri por amor. Já deixei ir embora aquilo que amava por achar mais importante a liberdade. Sofro de um auto amor do qual muito me orgulho. Philia, tenho de sobra. Eros? Sim, por favor!, Pragma, não sei se chegarei a tê-lo. Nem sei se quero.
Por ora, o amor para mim, apenas é a ideia de liberdade.

E para você, o que é o amor?

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