Conhecimento é poder.

Conhecimento é poder.
Por que o ler faz bem ao que há dentro de nós.

terça-feira, 29 de agosto de 2017

Caos

Não se trata dos planos que fazemos para amanhã. Se seremos pais, se seremos pessoas famosas ou influentes, se daremos um discurso na ONU. Não é sobre o que fazemos hoje e que poderá desencadear numa cadeia de eventos que poderá mudar o rumo da história. Não é sobre isso.
Um homem sai de casa às seis da manhã, porque se atrasou alguns minutos - tipicamente ele sai às cinco e meia; às seis ele já está na condução. Em função do seu atraso, este homem acaba tomando o ônibus das seis e quinze e senta-se ao lado de uma mulher, uma bela mulher. Seus olhos azuis cativam o olhar de qualquer outro homem que cruza seu caminho, até mesmo algumas mulheres veem-se encantadas. Seus olhos se cruzam e, sem sequer perceber trocam seus contatos. O ano é de 1986 e não há muita tecnologia que os ajude a manter uma boa relação que não seja a distância ou a contar com a possibilidade de que destino, ou qualquer outra dádiva qualquer, permita-os ao encontro apaixonado enquanto buscam entre si mais intimidade. Dois anos mais tarde a mulher irá lembrar-se silenciosamente o quanto foi feliz em ter saído de casa quinze minutos mais cedo. Carrega em seu ventre o fruto de seu adiantamento, e do atraso de seu marido. Que sortuda eu sou, pensa.
O ano é 2016. Trinta anos se passaram, o casal já não dispõe da beleza de sua juventude, apesar de não perder o amor sentido um pelo outro. A chama jamais se apagou. E, exatamente neste momento, a união se faz maior. O fruto que com tanto amor criaram acaba de ser preso após uma série de assassinatos entre outros crimes por ele cometido. A mãe, de tamanho desgosto desiste de viver meses após a prisão do filho; o pai parte logo depois. De um rosto esquecido em uma cela de prisão por sabe-se lá de humana compreensão por quanto tempo, tornar-se-á a mera lembrança das cicatrizes de inúmeras famílias que perderam seus entes queridos por suas brutas mãos. Mãos de um fruto que partiu de um amor vivido entre um homem que se atrasara alguns minutos para tomar um ônibus e encontrara então a mulher que decidira naquele dia sair de casa quinze minutos mais cedo.
Mas não é disso que se trata. Não se trata do caos e sua cadeia de eventos que não podem ser controladas ou previstas. Trata-se do agora, de quem somos agora. Trata-se do cuidado que devemos ter sobre o quanto o passado pode influenciar no futuro, e não o presente; pois, amanhã será história. Uma mera história, quer esquecida, quer contada.
Trata-se do momento em que o que rompe a barreira entre a moral e o erro são o discurso daquele(a) que faz-se puta quando é santa ou santa quando puta.
O momento não é de medo. As lágrimas que deixam meus olhos não são pavor, são apenas alívio. Frutos de um abismo que se abriu diante de mim, face a uma terra que parecia prestes a engolir a si mesma para fertilizar-se de todo o bem ou mal que em si habita.
O momento atende às rupturas, à dessalinização de um oceano de correntes sólidas e formadas que se desatam entre si e abrem um novo mar.
Dentro deste mar, sobram as dúvidas entre o novo, o velho e o meio. Aquele que não está velho demais para ser usado sem medo nem novo demais para ser usado pela primeira vez.
O mundo sorri e daqui só sai a tristeza e a intempérie de não entender o que pede o coração, o que o corpo sente e como dizer o que se quer. A mente rompe em um mar sem-fim de desesperanças e desencantos. Não há medo, não há pavor, não há temor, não há morte, não há nada. Há um pouco de vida para os que querem procurar, mas o medo de viver nos faz letárgico. Como templários, defendemos o Sagrado, mesmo enquanto pecamos. Mas jamais admitiríamos os nossos pecados. Como mortais e filhos do Eu Sou, estamos acima do Bem e do Mal. Só o Eu Sou poderá nos julgar. Aos que não creem, paciência! Sofrerão dores piores do que aqueles que preferem não crer, os que renegam.
O frio da febre ferirá a boca daquele que maldisser o que há em si. Para Deus não haverá o beijo da morte a sussurrar o amor no clamor de quem sente a dor e a única coisa que muda é a boca que grita. Não se sabe se grita por perdão, por amor, por quê.
Dos valores que aprendemos, aplicamos a quem amamos e lamentamos o fato de não tê-lo de volta. Apenas sentimos muito! Somos bons nisso. Gostamos do poder das desculpas e do muito sentir.
E tudo isso, de uma cabeça louca e desvairada como a minha, o que vem não são planos. Não se pode pensar o que será daqui a um, cinco ou dez anos. Os planos tenderão a nos levar a frustração no fim. O futuro torna-se um terreno incerto demais para se acreditar poder investir suas fichas e apostas. No fim, nos sobrarão vermes e moscas. Isso é certo.
Mas daqui, só resta viver o agora. O doce e saboroso agora que um dia fez parte de uma história de duas pessoas que, por uma série de gamas, gradações e motivos inesperados e incalculáveis se encontraram em algum lugar no tempo e, cá estamos nós, sendo o seu efeito borboleta.

Nenhum comentário:

Postar um comentário