Sempre pensei no que era de fato o 'jeitinho brasileiro' ou 'jeitinho carioca'...
Após trabalhar com o ensino de português para estrangeiros, descobri - ou percebi - o que é de fato o 'jeitinho'.
Acho mais interessante falar do 'jeitinho carioca' (já que sou um!).
Vamos tentar partilhar alguns significados de expressões cariocas:
A gente se fala – Expressão de despedida oficial.
Significa: “Tchau. Ambos sabemos que eu não vou te ligar e você não vai
me procurar” (“Pô, adorei te ver,
a gente se fala!”).
Aê – Tem origem no “aí”. Pode querer dizer algumas coisas: indicação de lugar (“Cadê fulano? Tá por
aê”); um vocativo (“
aê, que horas são?”); ou mesmo junto ao “pô”, para compor (“Pô
aê, vacilo…”).
Arroz – Aquele amigo que está sempre acompanhado de
mulheres e nunca “pega” ninguém. É aquele que nunca é o prato principal,
sempre servindo de acompanhamento (“Pô aê, fulano é maior
arroz”).
BG – Baixo Gávea – reunião de tradicionais bares populares, na Gávea. (“Partiu
BG?”). Os mais famosos são o Braseiro e o Hipódromo.
Bolado – Preocupado com alguma coisa (“Fulano ficou
bolado…”), pode ser usado no aumentativo também (“Meu pai ficou
boladão com meu boletim”).
Bora – Abreviação de “vamos embora” (“
Bora lá em casa?”).
Brother – Amigo, cara, parceiro, sujeito, indivíduo, ser (“Coé,
Brother! Você não vai acreditar…”).
Bucha – Mané – Vem do termo bucha de canhão, significando imprestável (“ele vacilou pra te dar um beijo? Que
bucha!”).
Coé – “Qual é” em carioquês, usado para começar frases também (“Coé, vamos pra praia hoje? Coé parceiro!).
Dar um balão – Enganar alguém no relacionamento (“Vai sair escondido da esposa? Conseguiu
dar o balão?).
Dar um migué – É como dar um balão, mas comercialmente (“Pô, fulano
deu o maior migué, saiu sem pagar!).
Dar um perdido – Igual a “dar um balão” (“Fulano mal começou a namorar e já tá
dando perdido na menina”).
Demorô – Talvez tenha origem no funk “Ô demorô para abalar”. Significa que um acordo foi fechado! (“Vamos nos ver amanhã?
Demorô!”).
Fala sério – Expressão de incredulidade (“Ele ficou com essa baranga?
Fala sério”! “Fala sério que a Madonna vai cantar?”).
Formô – Similar ao “demorô”, mas tem ligação direta
com algum programa futuro. Também oriundo da expressão funkeira “Formô o
bonde” (“Vamos praquela festa mesmo?
Formô”).
Ih, alá! – Expressão de surpresa quando a pessoa vê algo inusitado. Vem do “Ih! Olha lá”
… Nada a ver com a maior divindade Islâmica (“
Ih, alá! O cara dançando em cima do ônibus”).
Já é – Quer dizer Formô. Uma expressão que alguma coisa vai ser concretizada. (“Partiu BG?
Já é”).
Maluco – Amigo, cara, parceiro, sujeito, indivíduo, ser (“
Maluco, você não vai acreditar…” ou “Tu conhece aquele
maluco?”).
Mané – Mané (“Coé,
mané! Partiu BG?”).
Mermão – Vem da expressão “Meu irmão” (que seria uma tradução da expressão
Brother), mas vale pros amigos ou conhecidos (“aê
mermão, a parada é a seguinte”).
Mermo – Jeito carioca de falar “mesmo”
, utilizado desde o flanelinha da praia até os altos executivos (“É
mermo? Que mané!”).
Muleke – Idem ao mermão. A grafia com k é oriunda do uso da internet (“Coé
muleke!”).
Ninguém merece – Demonstração de insatisfação. (“Ele não falou com você?
Ninguém merece!”).
Partiu? – O jeito carioca de convidar (“
Partiu praia?” “Partiu night?”) Note que não se usa o “para” depois. Não cometa a gafe de perguntar: Partiu PARA a praia?
Passa lá em casa – Misto de despedida educada com
mentira deslavada. Quer dizer “Tchau, nos vemos por aí qualquer dia…
Nunca jamais apareça na minha casa”. (“Ah, foi ótimo te encontrar,
passa lá em casa”).
Perdeu a linha – Referência a alguém que fez algo inconsequente/insensato/sem noção. (“Fulano bebeu todas…
Perdeu a linha!” – nesse caso também caberia o Ninguém merece”).
Prego – Mané (“Fulano é maior
prego”).
Se liga – Presta atenção (“
Se liga no que vou te falar…”).
Tá de saca, né? – Abreviação de: você está de sacanagem comigo, não é? (“Você vai de bota e cachecol nesse calor?
Tá de saca, né?”).
Tá ligado? – Entendeu?, Sacou?, Está sabendo, Prestou atenção? (“
Tá ligado no trânsito, né?”).
Tamo junto – Demonstração de afeto entre amigos, pode derivar da expressão tamojuntoemisturado (“po,
tamo junto parceiro!”)
Bem, se não bastasse esse minidicionário, ainda temos que lidar com a sonora do sotaque carioca.
Não se vê um carioca que não comece uma frase com um "pô!" ou "porra!", "cara", não importa para quem seja; desde que seja o melhor amigo ou para uma pedra. Acho muito interessante a calma, leveza e paz de espírito de um carioca. Admiro isso desde minhas próprias atitudes; sempre que um aluno chega atrasado em minha aula pedindo mil desculpas por estar atrasado (na concepção dele sobre o assunto), eu respondo o meu usual "Relaxa! Isso é Rio."
E para constatar minha notação de funcionamento linguístico no que toca o comportamento da "língua carioca", sempre vale a pena ver o Filme '2012': No momento em que o mundo está acabando e todos os personagens estão no aeroporto, no meio de todo aquele caos, encontramos um famigerado e apressando russo que (devemos compreender seu nervosismo, afinal o mundo estava acabando), dizendo: "Anda! Vamos! Estou com pressa!" (ou algo assim).
Em resposta à sua atitude "grosseira" temos a representação de um brasileiro, curitibano, o ator Luis Melo, que mais parecia representar um carioca, dizendo, calmamente, cariocamente:
"Relaxa, gringo!"